É uma
viagem solitária e solidária, mas instigante e inspiradora
Literalmente,
Elias Rosa deixa qualquer um “no chinelo” se a conversa principal for esporte
sobre duas rodas. Mas não se está falando de motocicleta, que tem o motor cheio
de energia, mas sim do fôlego e da força gerada pelos pés. Como repete em cada
cidade por onde passa, o esportista internacional Elias da Silva, deu uma breve
parada em Lages nesta terça-feira (9), para apanhar uma declaração oficial na
Prefeitura.
O
documento serve como comprovante de sua passagem pelo local e será arquivado
junto a tantos outros em seu portfólio, um de seus companheiros assíduos de
viagem na bagagem de sua bicicleta. Ele mostra a todos os curiosos a pasta, em
que constam, ainda, recortes de jornais tendo Elias como protagonista. Algumas
folhas já amareladas, e as mais novas, seguiram por mais milhares de
quilômetros mundo afora. Roupas, ferramentas, barraca, garrafa térmica de água
e bomba de encher pneus fazem parte do acervo. O ciclista chegou a Lages noite
passada, vindo de São José do Cerrito. Esta é sua segunda vez na cidade, a
primeira foi quando passou vendendo tapetes tempo atrás.
Nos
municípios anfitriões o ciclista aproveita para buscar apoio de alimentação,
estadia e promover sua história. É uma viagem solitária e solidária.
A próxima
cidade do roteiro será São Joaquim e de lá irá pedalar rumo a Bom Jardim da
Serra, onde descerá a cobiçada Serra do Rio do Rastro, onde gravará novas
imagens deste paraíso, além de descer para Lauro Müller e Orleans, cortando a
região sul. Outros Estados estão nos planos, como Rio de Janeiro e Minas Gerais
pela BR 040 até estacionar em Brasília, onde começará uma nova missão. “Eu não
paro nunca, e agora vou direto a Brasília entregar todo esta papelada ao Ministério
do Esporte a fim de obter uma Bolsa Atleta Internacional (dois salários mínimos
mensais).” A previsão é de avistar a capital federal dentro de três meses. Se
conseguir, seu plano é se mudar para Manaus (AM) e trabalhar com um parente
dono de um camping/balneário
em chalés e cabanas em favor do esporte e do turismo.
430
mil quilômetros e 19 países
Oito anos.
Este foi o tempo que o esportista demorou para percorrer o Brasil inteiro, além
de 19 países, distribuídos em 12,8 mil municípios. Entres os países visitados
estão Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile, Peru, Equador, México, Venezuela,
Guiana Francesa e Inglesa, Suriname, Panamá, Bolívia, Colômbia, Guatemala,
Honduras, Nicarágua, El Salvador, Trinidad e Tobago e Cuba. São 21 anos vivendo
em plena aventura, comemorando a marca de 430 mil quilômetros (completados em
15 de dezembro, quando voltou ao Brasil por São Miguel d’Oeste). O ciclista
recordista já falecido, Manoelito Silva, percorreu 210 mil, portanto, o
catarinense já o ultrapassou com larga vantagem. “Tenho tudo para provar.
Estes documentos deixam a carga ficar mais pesada”, brinca o esportista bem
humorado. Coleciona, ainda, situações inóspitas, como ter acordado dentro de
uma barraca e se deparar com uma onça pintada na Amazônia. Para ele, os
argentinos são o povo mais interessante. “São anjos.”
No
entanto, o objetivo é mais ousado do que a Bolsa Atleta: Entrar para o Guiness Book como o
homem que mais pedalou em toda a América. “Eu prometi 500 mil quilômetros.
Recebo prêmios quando me convidam a participar de maratonas ciclísticas. Dou um
jeito de arrumar pneus mais finos, de corrida mesmo. Fiz isto em vários
países.”
Saudável
e apesar de guerreiro, sensível
Elias Rosa
tem 46 anos, 62 quilos e é natural de Pinhalzinho, passando boa parte de sua
vida em Palmito. “Minha casa é a bike”,
revela o ex-secretário de taxistas. Ele tem o ensino médio completo e fala
português, espanhol, castelhano e francês. Caçula de um total de 15 filhos, ele
não tem moradia fixa e nem paradas obrigatórias. É livre e realiza sonhos
invejados por grandes empresários presos dentro de seus ternos, e tensos com as
decisões do dia a dia. Tem irmãos e parentes em Joaçaba e Joinville. Não
é casado e pai de um casal de gêmeos, Jéssica e Júlio, com 25 anos, moradores
em Capivari de Baixo. Elias é incomunicável. “Faz anos que não os vejo.” Viaja
sem celular - já lhe furtaram oito aparelhos - apenas com uma simples câmera
fotográfica pendurada no pescoço, com
pen drives e cartões de memória. E é claro que ele não deixou de
registrar uma foto da Catedral Diocesana. Esta vida cheia de emoções começou
por incentivo de sua prima, Andréa Michele Alves, que deu um “empurrão” para
sair do comodismo. Um diário está sendo formado pelo esportista e dará ensejo a
um livro, “A Saga de um Aventureiro”. Ele se queixa da falta de um notebook, pois por
enquanto é de próprio punho que eterniza suas experiências.
Precisa
de apoio
Embora sua
história pareça plenamente leve e feliz, não é bem assim que ocorre no cotidiano
de quem teve esta coragem ímpar de andar de bicicleta pelo mundo todo. Uma das
dificuldades é encontrar mão de obra gratuita para alguns consertos do seu
veículo. “Eu tenho todas as peças (catraca, corrente e pé de vela), mas faltam
recursos para pagar o mecânico, fazer montagem e lubrificação. Preciso de apoio
em cada cidade. Sem dinheiro é complicado.” As reações quando é avistado nas
cidades são positivas. “Elas elogiam. Bruce Lee falava que força, raça,
determinação e coragem são as principais características de um vencedor. A hora
que o pôr-do-Sol chega eu sinto que vale a pena. É uma grande escola. Lidar com
o povo é maravilhoso.” A fé é sua fonte de inspiração. “Deus vai na garupa da
bicicleta e, muitas vezes, na frente. Todo dia pela manhã, antes de sair, faço
uma oração e peço para o Senhor tomar conta do meu caminho”, confessa, às
lágrimas.
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