Além da dor de perder um familiar e de não poder vela-lo devido à Covid-19, duas famílias tiveram que viver o drama de ter os corpos de entes queridos trocados na hora do velório, em um hospital em Santos, no litoral de São Paulo. O corpo de Márcia Pereira Franco, de 48 anos, foi trocado e enterrado no lugar de Marcelo Aninguaço de Oliveira, de 72. A unidade de saúde pediu desculpas e afirma que vai apurar o ocorrido.
Em entrevista ao G1 nesta sexta-feira (11), as famílias esclareceram que ambos ficaram internados por 21 dias, em decorrência do novo coronavírus, e morreram na última quarta-feira (9). Durante o tratamento, Márcia ficou sob os cuidados do Hospital Ana Costa, e Marcelo, do Hospital Vitória. Os dois foram levados para o Hospital Beneficência Portuguesa de Santos após o falecimento. No local, eles foram preparados para o sepultamento.
“Inclusive, nesse mesmo dia, conhecemos a família do Marcelo”, conta a sobrinha de Márcia, Gabryella Franco Nogueira, de 27 anos. Ela afirma que seus familiares foram orientados a chegarem ao hospital por volta das 13h de quinta-feira (10), para a realização do cortejo fúnebre, feito de carro, antes do sepultamento, que ocorreria no Cemitério Areia Branca, assim como o do idoso.
“Chegamos no horário combinado, demorou um pouco, mas achamos que ia ocorrer logo”, diz Gabryella. Depois de certo tempo, a organização da unidade chamou a família e avisou que os corpos haviam sido trocados. “Quem identificou esse erro foi o rapaz da funerária. Na hora que foi levar o corpo para começar o cortejo, ele viu”, explica.
A família do idoso foi avisada em seguida, mas já havia realizado o sepultamento de um corpo que, até então, pensava que era o dele. “Eu estava saindo do cemitério quando a moça da administração chamou a gente para falar que havia um problema, e que o pessoal da Beneficência tinha pedido para que eu fosse lá reconhecer o corpo do meu pai. Falei que tinha acabado de enterrá-lo, e foi quando ela falou que tinha ocorrido a troca”, afirma a filha de Marcelo, Márcia Bastitas de Oliveira, de 35 anos.
Márcia relata que chegou até a escrever o nome do pai na lápide e colocar as datas de nascimento e falecimento durante o sepultamento. Depois de identificado o erro, o corpo da mulher foi desenterrado e encaminhado novamente para o hospital, onde foi realizado um novo reconhecimento por familiares.
“Após reconhecer o corpo do meu pai, pedi para acompanhar o caixão até o carro funerário, para ter certeza que estavam levando o certo”, revela a filha do idoso. A família de Marcelo teve de realizar dois sepultamentos em poucas horas. A confusão, que ocorreu também com a coroa de flores das duas vítimas, terminou somente no fim do dia, quando os corpos foram enterrados de maneira correta.
“A gente via matérias desse tipo e ficava indignada. Nunca pensei que fosse passar por isso aqui em Santos. A gente só queria oferecer um enterro digno para ele, já que ele não teve um velório, e até isso eles tiraram da gente”, desabafa a filha.
Para Gabryella, o erro é absurdo e inadmissível. “A sensação é de impotência, injustiça e falta de empatia. A minha avó teve que reconhecer o corpo pela segunda vez, é muito complicado. Muito triste”, afirma.
“Imagina quantas pessoas podem ter passado por isso sem saber? Fico me perguntando se houve outros casos que não vieram ao conhecimento das pessoas”, questiona a filha do idoso. O caso foi registrado no 5º Distrito Policial de Santos e será investigado pela Polícia Civil.
Em nota, a Beneficência Portuguesa de Santos explicou que as informações sobre as saídas dos caixões foram invertidas, e que abrirá sindicância para apurar a responsabilidade pela troca dessas informações. Além disso, a direção pede desculpas pelo ocorrido.
Confira a nota na íntegra:
"A direção do hospital abrirá sindicância para apurar a responsabilidade na troca de informação aos familiares sobre o sepultamento do Sr. Marcelo Aninguaçu de Oliveira [72 anos] e da Sra. Márcia Pereira Franco [48 anos], ambos na tarde desta quinta-feira, no Cemitério de Areia Branca, nesta cidade.
Os corpos em urnas lacradas devido ao falecimento por Covid-19, em suas identificações constando os horários de sepultamento com diferença de 30 minutos, respectivamente, 13h e 13h30.
A informação sobre as saídas dos caixões foi invertida, e quando o motorista do segundo sepultamento se preparava para sair, a equipe do Serviço de Luto percebeu o engano e de imediato entrou em contato com a direção do cemitério onde já estava a urna com o corpo que deveria ser sepultado às 13h30, e lá também estavam seus familiares.
De imediato, foi providenciada a informação para que os corpos não fossem enterrados com nomes trocados.
Lamentamos profundamente a dor dos familiares pela perda de seus entes queridos, bem como pelo imenso transtorno causado, pois em meio à pandemia da Covid-19, quando fatores alheios à nossa vontade, independentemente dos cuidados que procuramos ter diante das diferentes situações ocasionadas pelo momento de dor em que vivemos, aflorado pelas incontáveis perdas, somos surpreendidos por essa adversidade. A despeito das providencias que serão tomadas, nosso pedido de desculpas".
G1.
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